MODERNISMO
Preliminares
Deve-se entender por modernismo o estilo da época que domina o Brasil a partir de 1917. O movimento retoma certas colocações de estilos anteriores, sobretudo o Simbolismo, e renova substancialmente a poesia e a ficção nacionais.
As vanguardas
As atitudes literárias brasileiras são reflexo, em grandes partes, de uma série de fenômenos sociais, políticos, econômicos, éticos e culturais da Europa. Como muito bem explica Raul Bopp, num pequeno livro fundamental – Movimentos Modernistas no Brasil -, havia em Paris um movimento curioso sobre o Brasil, onde elementos da cultura e da arte francesas achavam interessante a terra brasileira, seu colorido tropical, o exotismo de cores, plantas e paisagem, graças a divulgação feita por Paul Claudiel e Darius Milhaud, quando Enviado Plenipotenciário da França, o primeiro, e adido cultural, o segundo. O ritmo do samba estava presente em Paris, tratava-se um colóquio sobre o Brasil. Ora, a aristocracia rica de São Paulo, dirigindo-se ao menos uma vez por ano a Paris, acabou gostando e tomando conhecimento desses fatos, trazendo-os para o Brasil, impondo aqui uma visão brasileira por olhos franceses: o tropical, o brilhante, o primitivismo e encanto.
Isso teria sugerido uma renovação da arte e da literatura nacionais, chegando Oswald de Andrade, legítimo representante da aristocracia, a dizer que “estamos atrasados de cinqüenta anos em cultura, chafurdados em pleno parnasianismo”. Começando a circular entre a elite econômica estes conceitos de um Brasil novo, pleno de excelências, acabaram as elites literárias e artísticas por chegar àquela conclusão: era preciso sacudir o marasmo, criar um movimento capaz de pôr a limpo as idéias novas, substituir o parnasianismo pelo Futurismo.
Tudo isso é resultado de um trabalho longo e mais sutil, iniciado com o século, quando a Europa e a América foram sacudidas por concepção novas sobre a realidade e o homem, quando havia outra mentalidade diferente daquela do século anterior.
Cubismo
A arte moderna vinha dos movimentos cubistas, uma visão geométrica do mundo, visão de figuras planas com predomínio da linha reta sobre a linha curva. Fixou-se em Paris de 1907 a 1914 a partir da obra de Pablo Picasso e Georges Braque. Constitui uma nova linguagem pictórica e terá profunda repercussão na literatura. A arte (e isto vale não só para a pintura mas para a música, para a literatura, para a escultura, etc.) deve afastar-se da simples imitação e buscar a concepção e a criação. A Pintura Pura: as formas geométricas querem corresponder ao que são as notas musicais. A forma não é fantasia ou algo gracioso. É evocação de uma realidade metafísica, essencial e necessária que a Física ( Radioscopia e Óptica) tem valorado. A concepção intelectual pura (a forma geométrica é pura e abstrata) do artista, é obediente a leis interiores que reguem as atividades do seu próprio espírito. O Cubismo é uma tentativa de dar estrutura ao quadro. Reage a partir dos ensinamentos do Fauvismo, aos processos do Impressionismo. A rigor, estaria querendo voltar ao que a arte era antes do Impressionismo. O Cubismo recoloca o corpo no espaço, o volume, porém sem o estático que caracteriza, p. ex., o Renascimento; quer o tempo como devenir, como fluir. O tempo-espaço quer presentificar-se na duração. Daí o espaço querer registrar o movimento. Explode a concepção convencional de arte. É outra sintaxe e outro vocabulário. Após o Cubismo foi possível a colagem, o ready made (coisa feita), a pop art. Em literatura, o Cubismo foi absorvido pelo Futurismo.
Impressionismo
Consiste na comunicação das impressões provocadas no artista pela realidade exterior. Há o registro no momento mesmo, tornando-se o impressionismo uma sorte radical de naturalismo. Nas artes plásticas verifica-se a libertação da cor e da luz; sensorialismo; registro da experiência fugaz; rompimento com a estruturação de formas e com o espaço pictórico; dissolução da linguagem pictórica. Essa tendência foi vital para a arte e para a literatura modernas, pois é a partir do Impressionismo, a rigor, que explodem todas as vanguardas européias do início do século.
Futurismo
É cinemático e mecânico. Absorve o Cubismo, aproveitando-o para a literatura através da obra de Max Jacob, Cendras, Reverdy, Jean Cocteau e Andre Salmon. A renovação industrial, as invenções de instrumentos novos e meios de comunicação que aproximam homens de maneira extraordinária, o progresso incipiente que as máquinas traziam fizeram explodir na Itália o Futurismo, de Marinetti, ditado em 1909, tornou-se popular no Brasil graças ao empenho de Oswaldo de Andrade. Marinetti quis interpretar a realidade presente, o sentido que as invenções tinham para a existência do homem, o quanto valia a descoberta da máquina para modificar as posições humanas na face da terra. Altera-se a filosofia de vida. A agitação, o cinema, o industrialismo, o proletariado, o automóvel, o homem vencendo o tempo, o homem no centro do tempo (ver o Cubismo): os esgotamentos das formas estereotipadas de arte e literatura fizeram com que o homem sentisse o mundo de um modo novo, diferente, original.
Expressionismo
Ao lado do Futurismo, que veio da Itália, havia o Expressionismo, movimento artístico de origem alemã, cujos pressupostos são a liberdade formal e a livre expansão do espírito, a necessidade de expressar os sentimentos tais quais são, um total subjetivismo (interessa apenas o que o artista sente seu mundo interior em oposição à realidade extrínseca). A rigor é uma forma de contestação ao Impressionismo, ou seja, o velho conflito entre o sul e o norte, a latinidade e o germanismo, o cosmopolita e o interiorano, o clássico (elaborado, integrado) e o romântico (apocalítico). De qualquer modo,porém, é importante perceber que ambos, mesmo em luta, contribuem a seu modo para alterar substancialmente os padrões estéticos do séc. XX. Resultam, do seu aproveitamento, várias técnicas literárias, como o monólogo interior, o fluxo de consciência (elementos vitais na literatura contemporânea e na descrição do home e sua situação no mundo), a apreensão do sentimento de metamorfose por que atravessa o espírito, o universo fragmentado e a diluição do que era sólido e seguro, uma nova concepção da linguagem, formas lingüísticas originais e inéditas.
Dadaísmo
Esse movimento revolucionário em arte, que buscará na verdade a anti-arte, explodiu definitivamente a partir de 1914, com a Primeira Grande Guerra. Esse movimento elegeu – seu líder é Tristan Tzara – em 1916, na Suíça, um deus – Dada – (não representa nada, não é nada, é apenas uma palavra vazia de significado à qual pode-se, portanto, apor o significado que se quiser).Essa postura representa a subversão de valores,a confusão nos processos políticos, sociais e econômicos, a cultura posta em choque pelo conflito bélico. Lançaram manifestos, defenderam a anti-arte, criaram uma obra em que a tônica dominante era o sarcasmo, o descrédito humano, a mais grosseira burla. Defenderam a anarquia social e o suicídio individual. O Dadaísmo é fundamental para a evolução da arte e da literatura.
Surrealismo
É a mais importante conseqüência do Dadaísmo. Este movimento busca os conflitos interiores, e alma humana em delírio e em estado puro. Se o mundo se partiu de vez, deve-se buscar alguma coisa, uma esperança, algo incontaminado: as camadas profundas do inconsciente. O Surrealismo opõe-se por isso, com tenacidade, à realidade, ao mundo palpável e concreto. O líder surrealista foi André Breton,que proponha a escrita automática como forma de chegar ao inconsciente. Aliás, Breton e seus seguidores,que sempre defenderam as “palavras em liberdade”, dos futuristas, os jogos de linguagem de vários autores modernos, a revolução da palavra, o letrismo, faziam questão de separar e esclarecer diferenças como “escrita automática” e “monólogo interior” (de Joyce). Achavam que este era uma retomada do conceito de mímesis,forma de naturalismo. Ao esforço evasivo do Dadaísmo, propunham soluções encontradas na psicanálise:tentativa científica, experiassinados por Breton: um de 1924, outro de 1930. Na literatura destacaram-se: Philipe Soupaut, Louis Aragon,Paul Elaurd. Teatro: Antonin Artaud. Artes: Hans Arp, Salvador Dali, Max Ernst, J. Miró.
Esta a agitação européia no momento que corresponde ao pré-modernismo no Brasil. Influiu, mais ou menos, nos intelectuais brasileiros. Tal influência é tanto mais forte quanto percebemos que o maior desejo do brasileiro é passar uma temporada em Paris, cidade que caldeia e assimila tudo o que se faz de importante no mundo. Esse contágio, a que Tristão de Ataide dá o nome de “lei da repercussão”, foi aproveitado sobretudo pelos grupos do Rio e de São Paulo.
Arte contemporânea
Como entender o seu sentido?
Valéria Peixoto de Alencar
Se levarmos em conta a origem da palavra arte ("ars" significa técnica ou habilidade), é curioso notar que há uma contradição: muitos artistas não expressam suas idéias através de uma habilidade técnica. Apesar de, muitas vezes, possuírem tais habilidades, estão preocupados em discutir outras questões, provocar outras reflexões.
"Roda de bicicleta", Marcel Duchamp (1913): não é possível usar o banco ou a roda que compõem essa obra de ate. |
Em 1913, momento das vanguardas européias, Marcel Duchamp propôs obras chamadas "ready-made", feitas a partir de objetos do dia-a-dia. O que ele fazia era apresentar esses objetos de forma descontextualizada e sem a possibilidade de serem utilizados. Por exemplo: um mictório no meio de uma sala, sem encanamento.
Com essa "provocação", Duchamp chamou a atenção para a arte produzida naquele momento. Ela não seria mais uma representação do real, como um retrato. Ela seria a própria realidade.
Quem decide o que é obra de arte
O objeto de arte não representa algo, mas ele é algo. Mesmo se o artista não tiver fabricado os elementos que compõem sua obra. Duchamp também questionava o conceito de arte como associado a um ideal de belo e à crítica de arte.
O objetivo da obra de arte, assim, era também promover o debate sobre a definição e a finalidade da arte.
Se não existe uma definição do conceito arte, quem afinal decide o que é obra de arte ou não?
Muitos são os fatores para classificar uma produção como obra de arte: o contexto histórico, o mercado de arte, a aceitação entre os artistas e, principalmente, a crítica.
Crítica de arte
A arte, como resultado de análise e avaliação, pode adquirir novas dimensões e formas de expressão por meio da crítica. Ela colabora para que a sociedade se mantenha atenta aos valores da arte no passado e no presente.
A crítica leva em conta o fato de que a arte é um produto da humanidade que expressa suas experiências e emoções através da linguagem.
A evolução dos conceitos artísticos, a transformação dos valores, são aplicáveis às diferentes formas: a literatura, o teatro, a dança, o cinema, a fotografia, a música e tantas outras que surgem, como a web arte.
10 aspectos da arte contemporânea
Cacilda Teixeira da Costaespecial para a Folha de S.Paulo
Em 1910, o russo Wassily Kandinsky pintou as primeiras aquarelas com signos e elementos gráficos que apenas sugeriam modelos figurativos, uma nova etapa no processo de desmanche da figura, que se iniciara com Pablo Picasso e Georges Braque, na criação do cubismo, por volta de 1907. Assim, a abstração, uma representação não-figurativa —que não apresenta figuras reconhecíveis de imediato— tornou-se uma das questões essenciais da arte no século 20. Movimento dominante na década de 1950, a abstração pode ser conhecida também em livros como "Abstracionismo Geométrico e Informal", de Fernando Cocchiarale e Anna Bella Geiger (Funarte, 308 págs., esgotado).
A "arte concreta", expressão cunhada pelo holandês Theo van Doesburg em 1918, refere-se à pintura feita com linhas e ângulos retos, usando as três cores primárias (vermelho, amarelo e azul), além de três não-cores (preto, branco e cinza). No Brasil, o movimento ganhou densidade e especificidade própria, sobretudo no Rio e em São Paulo, onde se formaram, respectivamente, os grupos Frente e Ruptura. Waldemar Cordeiro, artista, crítico e teórico, liderou um grupo com o objetivo de integrar a arte a aspectos sociais como o desenho industrial, a publicidade, o paisagismo e o urbanismo. Para saber mais, consulte o site do Itaú Cultural (http://www.itaucultural.org.br/) e o livro de Helouise Costa "Waldemar Cordeiro e a Fotografia" (Cosac & Naify, 78 págs., R$ 37).
O grupo Neoconcreto teve origem no Rio de Janeiro e teve curta duração, de 1959 a 1963. Ele surgiu como conseqüência de uma divergência entre concretistas do Rio e de São Paulo. Em 1959, Ferreira Gullar publicou um manifesto onde as diferenças entre os grupos são explicitadas, e a ruptura se consolidou, gerando um movimento brasileiro de alcance internacional. Entre os artistas mais conhecidos estão Hélio Oiticica e Lygia Clark, além do próprio Gullar. Três excelentes introduções são "Etapas da Arte Contemporânea" (Revan, 304 págs., R$ 48), de Gullar, "Neoconcretismo" (Cosac & Naify, 110 págs., R$ 59,50), de Ronaldo Brito, e "Hélio Oiticica Qual É o Parangolé?" (Rocco, 144 págs., R$ 24,50), de Waly Salomão.
A aparição da pop art (ou novas figurações), na Nova York do final dos anos 50, foi surpreendente. Longe de ser uma representação realista dos objetos, ela enfocava o imaginário popular no cotidiano da classe média urbana e mostrava a interação do homem com a sociedade. Por isso, tomava temas de revistas em quadrinhos, bandeiras, embalagens de produtos, itens de uso cotidiano e fotografias. No Brasil, interagiu com a política e teve em Wesley Duke Lee, Antonio Dias, Nelson Leirner, Rubens Gerchman e Carlos Vergara seus expoentes. O site da Tate Gallery (http://www.tate.org.uk/) traz bons exemplos internacionais.
A arte conceitual trabalha os estratos mais profundos do conhecimento, até então apenas acessíveis ao pensamento. Nascida no final dos anos 1960, ela rejeita todos os códigos anteriores. No Brasil, o movimento conceitual coincidiu com a ditadura militar (1964-1985), e a contingência lhe deu um sentido diferente da atitude auto-referencial, comum nos outros países. Um dos artistas brasileiros mais ligados ao conceitual é Cildo Meireles, cujo trabalho foi estudado pelo crítico e curador americano Dan Cameron, em livro que leva o nome do artista (Cosac & Naify, 160 págs., esgotado). "Poéticas do Processo: Arte Conceitual no Museu" (MAC-USP/Iluminuras, 197 págs., R$ 33,60), de Cristina Freire, traz visões mais gerais do movimento.
A presença do objeto na arte começa nas "assemblages" cubistas de Picasso, nas invenções de Marcel Duchamp e nos "objets trouvés" (objetos encontrados) surrealistas. Em 1913, Duchamp instalou uma roda de bicicleta sobre uma banqueta de cozinha, abrindo a rota para o desenvolvimento dessa nova categoria das artes plásticas. Hoje em dia, os "ready-mades" —obras que se utilizam de objetos prontos— já se tornaram clássicos na arte contemporânea. Por aqui, a essas experiências começaram a ser realizadas somente nos anos 60, com os neoconcretos e neofigurativos.
As instalações se caracterizam por tensões que se estabelecem entre as diversas peças que as compõem e pela relação entre estas e as características do lugar onde se inserem. Uma única instalação pode incluir performance, objeto e vídeo, estabelecendo uma interação entre eles. O deslocamento do observador nesse espaço denso é necessário para o contato com a obra, e é assim que a noção de um espaço que exige um tempo passa a ser também material da arte. Para um passeio virtual, visite o site do Museu de Arte Contemporânea (http://www.mac.usp.br/).
Na forma como o compreendemos hoje, o "happening" surgiu em Nova York na década de 1960, em um momento em que os artistas tentavam romper as fronteiras entre a arte e a vida. Sua criação deve-se inicialmente a Allan Kaprow, que realizou a maioria de suas ações procurando, a partir de uma combinação entre "assemblages", ambientes e a introdução de outros elementos inesperados, criar impacto e levar as pessoas a tomar consciência de seu espaço, de seu corpo e de sua realidade. Os primeiros "happenings" brasileiros foram realizados por artistas ligados ao pop, como o pioneiro "O Grande Espetáculo das Artes", de Wesley Duke Lee, em 1963.
Da integração entre o "happening" e a arte conceitual, nasceu na década de 1970 a performance, que se pode realizar com gestos intimistas ou numa grande apresentação de cunho teatral. Sua duração pode variar de alguns minutos a várias horas, acontecer apenas uma vez ou repetir-se em inúmeras ocasiões, realizando-se com ou sem um roteiro, improvisada na hora ou ensaiada durante meses. O precursor das performances no Brasil foi Flávio de Carvalho, que, em 1931, realizou sua "Experiência Número 2", caminhando em meio a uma procissão de Corpus Christi, em sentido contrário ao do cortejo e vestindo um boné. Sobre o artista, ver "Flávio de Carvalho" de Luiz Camillo Osório (Cosac & Naify, 120 págs., R$ 59,50).
De difícil veiculação pela TV comercial, a videoarte tem sido divulgada pelo circuito tradicional das galerias e museus. Além dos pioneiros, Wolf Vostell e Nam June Paik, destacaram-se inicialmente as pesquisas de Peter Campus, John Sanborn, Gary Hill e Bill Viola, que tem um bom site (http://www.billviola.com/). No Brasil, as primeiras experiências foram realizadas nos anos 1970 e apresentadas por artistas como Anabela Geiger, Sonia Andrade e José Roberto Aguilar.
Exposições recomendadas: "Sonhando de Olhos Abertos", 274 obras dadaístas e surrealistas (Instituto Tomie Ohtake, até 29/11), 26ª Bienal de Artes São Paulo (parque Ibirapuera, até 19/12) e "Fragmentos e Souvenirs Paulistanos Vol. I" (Galeria Luisa Strina, até 22/10), todas em São Paulo.